Botswana, Foto T.Abritta, 2008

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Telegrama


          Emoção na cidade.

          Chegou telegrama para Chico Brito.

          Que notícia ruim,

          que morte ou pesadelo

          avança para Chico Brito no papel dobrado?

 

          Nunca ninguém recebe telegrama

          que não seja de má sorte. Para isso

foi inventado.

 

          Lá vem o estafeta com rosto de Parca

          trazendo na mão a dor de Chico Brito.

          Não sopra a ninguém.

          Compete a Chico

          descolar as dobras

de seu infortúnio.

 

Telegrama telegrama telegrama

Em frente à casa de Chico o voejar murmure

de negras hipóteses confabuladas.

O estafeta bate à porta.

Aparece Chico, varado de sofrimento prévio.

 

Não lê imediatamente.

Carece de um copo d’água

e de uma cadeira.

Pálido, crava os olhos

nas letras mortais.

 

Queira aceitar efusivos cumprimentos passagem data natalícia espero merecer valioso apoio distinto correligionário minha reeleição deputado federal quinto distrito cordial abraço Atanágoras Falcão

 

Poema de Carlos Drummond de Andrade.

 

          O telegrama já foi o mais rápido meio de comunicação.  As letras e algarismos eram codificadas por pontos e traços, segundo o Código Morse e a mensagem transmitida por pulsos elétricos curtos (pontos) e longos (traços) através dos cabos telefônicos. 

          Para quem não conheceu, ver abaixo a imagem de um telegrama enviado “com urgência”.

Ah, “PT’ significa ponto.



quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Manguezais


          Os manguezais marítimos são importantes ecossistemas, pois além de servirem de berçário para diversas espécies, são uma fonte de renda para comunidades locais. 

          Manguezais marítimos também têm uma importante função que é proteger as terras costeiras do impacto das marés altas, ainda mais com a subida dos oceanos que podemos observar em nosso litoral,

          Com a destruição irresponsável destes ecossistemas, várias espécies estão em processo de extinção, como, por exemplo, o peixe-boi marítimo, que não encontrando águas abrigadas, acabam tendo suas crias no meio do oceano, sendo perdidas e acabando em alguma praia. 

          Alguns têm sorte de serem recolhidos e levados para um centro de recuperação que tentará reintroduzi-los na vida selvagem. 

          Visitei dois destes centros, um na ilha de Itamaracá, em Pernambuco e outro no litoral de Alagoas.

          Nestes centros os filhotes são criados primeiramente em aquários, depois levados para um cercado na foz de um rio, para finalmente serem soltos.  É um processo difícil, pois estes animais tendem a serem domesticados, procurando a companhia das pessoas. 

          Na foto abaixo, mostramos um peixe-boi marítimo que já deveria ter partido para o mar, mas infelizmente tornou-se quase um animal doméstico. 

 Alagoas.  Foto T.Abritta, 2012.



domingo, 4 de outubro de 2020

Artefatos

 

“Os resultados mais correntes da conduta humana, os dados arqueológicos mais vulgares, podem chamar-se artefatos, coisas feitas ou desfeitas por uma deliberada ação humana.”

Gordon Childe.

 

          Olhando esta pedra na minha estante, lembro-me da Praia do Moçambique, na Ilha de Santa Catarina, onde estive há muitos anos. 

          A praia, de areias cristalinas, tinha uns oito quilômetros de extensão e margeava uma reserva de vegetação costeira praticamente impenetrável. 

          Depois de percorrer uma grande distância nesta praia, iniciei o retorno, pois a maré estava subindo e as ondas provocavam desabamentos na encosta, levando terra e vegetação, quando vi uma pedra que afundava na areia. Corri e consegui pegá-la.

          Seria esta pedra um artefato arqueológico, como sugere sua forma?  Tinha aproximadamente uns dezoito centímetros de comprimento e assemelhava-se – ver figura abaixo – a um percutor bem polido, ferramenta lítica usada, por exemplo, como batedor, mão de pilão e inúmeras outras finalidades.

          Pensando na frase do arqueólogo Gordon Childe, usada como epígrafe para este texto, fico especulando: seria esta “pedra”, o vestígio único de algum grupo que ocupou este litoral?  Afinal, o nível do mar era muito mais baixo e foi subindo, submergindo terras emersas ao longo dos anos, formando – aproximadamente há uns sete mil anos atrás – o litoral como hoje conhecemos.  Portanto, vestígios de povos que ocuparam este litoral podem estar submersos e inacessíveis. 

          Olho aquela pedra na minha estante e passo a considerá-la um solitário artefato, vestígio de povos perdidos no tempo. 


Percutor-Praia do Moçambique, Ilha de Santa Catarina, SC.