Botswana, Foto T.Abritta, 2008

segunda-feira, 2 de março de 2015

Nas Alturas de Itatiaia


          Inicio o ano de 2010 diante das Montanhas de Itatiaia, na parte alta do parque.
          Silêncio total.  A paisagem vazia leva-nos à introspecção.  Escaladores de alturas não são vistos – tempos chuvosos, pedras escorregadias.  Nem outras pessoas por aqui passeiam – caminhos pedregosos. 
          Chegando à Garganta do Registro; na parte mais alta do caminho para Itamonte, a quase mil e oitocentos metros de altura, entra-se no parque.  O jipe, mesmo com tração nas quatro rodas, salta, trepida e resvala no que, há muito, foi estrada.  Hoje, amontoado de pedras soltas, entulhadas ao acaso.  Caminho quase inexistente.  Apenas traços do rumo abandonado pelo homem.  A Natureza torna-se mais presente com o verde tentando cobrir o negrume dos sucessivos incêndios florestais e telhados abandonados nas ruínas das velhas construções.
          Após alguns quilômetros continuamos a pé.  Mas a caminhada foi breve.  As pernas já não são as mesmas de ontem.
          Esmagado entre o azul do céu e a aspereza das pedras, pensava: conheci os sete continentes.  Florestas, desertos, geleiras, savanas e vulcões.  Rios, lagos, oceanos.  Mas não chegarei mais às alturas de Itatiaia.  Ao longe fico a contemplar.  Passadas quatro décadas, apenas aqui cheguei.  Suas chaminés já venci.  Suas alturas já subi.  Suas rochas já senti.  O céu quase toquei.  Entre suas nuvens andei. 
          Tão longe repousa agora o Pico das Agulhas Negras.  Tão distante a Serra das Prateleiras com chaminés, paredões e vistas das regiões de Itatiaia e Resende dobrando-se no horizonte distante.  As gigantescas rochas com formas singulares, como a Pedra da Tartaruga, apenas no fundo da memória passada. 
          Sinto não ter caminhado por outras alturas.  Lá em cima ficaram os Himalaias, as neves do Kilimanjaro.  O Aconcágua derretendo-se ao sol.
          Até o Pico da Bandeira – ah, que esforço pra chegar lá – deixou de ser nosso ponto culminante.  Até então perdido na imensidão Amazônica, descobriu-se o novo teto do Brasil, o Pico da Neblina, onde jamais pisarei.  Pouco mais ao norte, o Monte Roraima, agora para mim apenas a montanha que inspirou o Mundo Perdido de Conan Doyle. 


            Agora estão as montanhas estendidas
como cavalos azuis adormecidos.

          No silêncio, descanso para o penoso retorno.  Um calango atrai o olhar, mostrando caminhos a explorar.  Vidas humanas individuais são finitas.  A grandeza da Natureza é que traz sentimentos de eternidade. 
Agora, o pequeno réptil caminha sobre fungos, atravessa “florestas” de flores silvestres, sumindo no mimetismo e riqueza dos campos de altitude com suas folhas e pétalas refletindo infinitas cores de luz. 
Muito a explorar.  A descobrir. 
Alegro-me.  No fundo, aqui estou apenas para despedidas.  Aceno ao longe, muito longe, nesta jornada sentimental. 
          Tomarei outros rumos.  Seguirei o calango. 

            No horizonte, o céu é meditativo e suave;
            Parece que repousando no limite do tempo,
seus corações se reconciliaram. 


Nota:

Fragmentos intertextuais da poesia Montanhas Ao Meio-Dia, de Charles Edward Eaton, traduzida por Jorge de Lima.




Iguana. Chichén-Itzá, México. Foto T.Abritta, 2006.

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