Os visitantes do Tibet normalmente ficam encantados com
a beleza de sua
natureza e a grandiosidade
de seus palácios
e templos , principalmente
com o gigantesco
Potala, centro político
e espiritual , no alto
de uma colina no centro
da capital Lhasa (V. figura 1), de onde reinava o Dalai Lama ,
em uma verdadeira “Cidade
Proibida ” para
o povo .
Mas , como
observou Mario Vargas Llosa falando sobre
viagens e seus
lugares preferidos no mundo , não se
pode entender uma sociedade
e um país
se não se interessar
minimamente por sua
problemática política . Assim
procurei ver o que
normalmente não
é visto , com
os olhos insuspeitos
de uma pessoa que, para lembrar a idade da
esposa, tem que associar
a sua data
de nascimento ao ano da Revolução Chinesa.
O
Tibet, antes da invasão
chinesa na década de 50, era um reino teocrático
onde o Dalai Lama
reinava absoluto , com
o povo vivendo em
um sistema
medieval , pagando tributos
e enviando alimentos para
os monastérios , verdadeiras cidades , como o
Monastério de Ganden com dois mil monges e Drepung, o maior
de todos , com
dez mil monges .
Os
chineses chamam a invasão do Tibet de libertação ,
mas na realidade
substituíram o poder medieval
do Dalai Lama por
um sistema
de apartheid , onde
os tibetanos são sistematicamente
eliminados, expulsos de seu próprio país e têm a sua
cultura destruída, para
serem substituídos por uma massa chinesa passiva
e bem comportada.
Hoje , esta política
já reduziu drasticamente a população tibetana – já é menos
da metade da chinesa – neste país chamado eufemisticamente de “Território
Autônomo do Tibet”. Neste massacre físico e cultural, os tibetanos são
considerados seres inferiores ,
diante da suposta
superioridade racial
chinesa. Nas escolas
só se ensina
o mandarim. Todas as oportunidades de emprego ,
como cargos públicos
e até um
simples alvará
para a abertura
de um comércio, contemplam
prioritariamente os cidadãos
chineses. Este
governo de ocupação
legisla até no mundo
sobrenatural , com
a “Regulamentação Nacional Chinesa sobre Assuntos Religiosos ”, que
determina qual é o Lama
que vai encarnar
o supremo Dalai Lama
após sua morte . O interessante
é que o governo
de Pequim escolhe também os bispos católicos
e o Vaticano simplesmente
se cala , em
um pragmatismo
político que
rasga princípios éticos
que deveriam ser
inegociáveis .
Na
chegada ao aeroporto
de Lhasa, todo o esplendor
da paisagem se dissipa com a estrutura
militarista de recepção . No caminho
para a capital
levamos aproximadamente uma hora ,
percorrendo uma estrada ladeada de instalações militares ,
que, ao longo do seu percurso, vai destruindo a paisagem ,
cortando montanhas e aterrando lagos , dando uma amostra
da “modernização chinesa”, onde impera o
mau gosto ,
o desrespeito ambiental e o desprezo a qualquer valor cultural, em
um culto
absoluto ao lucro
fácil .
Foto T.Abritta, 2007.
A Igreja
Universal chinesa
A nossa
“peregrinação ” continuou visitando o Jokhang, um
dos templos mais
sagrados do budismo
tibetano, restaurado às pressas naquele estilo “alegoria
de escola de samba ”
e transformado em uma espécie de Disneylândia chinesa. Na entrada
do templo havia um
estacionamento para
os luxuosos automóveis
das autoridades chinesas, e as massas de turistas tinham que
se esgueirar entre
os carros , tal bando
de zumbis seguindo guias com bandeirinhas
coloridas que vão
gritando informações e fazendo o circuito da visita ,
parando em alguns
pontos para fotografias , como
se fosse a esteira rolante de uma fábrica . As paredes do templo
são cobertas
de dinheiro, e por todos
os lados observamos cofres para as doações , que são
recolhidas constantemente e levadas para uma pequena sala onde o dinheiro é contado e ensacado (V. figura 3).
A fé popular gerando
lucros para o capitalismo chinês.
No
final do dia
as bilheterias deste circo são
fechadas e assistimos a uma cena de cortar o coração , com
a chegada de centenas
de peregrinos tibetanos com roupas típicas, mostrando a enorme
diversidade cultural que Pequim quer
apagar da História . Nos arredores do templo
fica o quarteirão da rua Barkhor,
ainda não
destruído, onde podemos viver
um pouco
do verdadeiro Tibet, tomar
uma bebida local
– horroroso chá misturado com manteiga de
yak – e refletir
que a luta
do povo tibetano deve ser
inserida em um
processo mais
amplo de autodeterminação
dos povos, como os curdos, palestinos , armênios e todos
aqueles massacrados neste mundo , desde os
beduínos em
Israel aos afegãos estraçalhados pelos bombardeios da OTAN.
A visão de um
grupo de Khampas, com seus cabelos envoltos em lã vermelha (V.
figura 4), reforça esta idéia . Por que não reivindicar a criação do país
Kham e de outros
que formariam uma federação
tibetana? Afinal
de contas , conforme
o Zen Budismo ,
O caminho
do meio está onde
não há nem
meio nem
dois lados, aqui formados pela
opressão de Pequim e pelo
antigo regime
medieval dos Dalai Lama .
Figura 4 – Um
grupo de Khampas, um povo altivo e guerreiro
que habita a região
Kham.
Foto T.Abritta, 2007.
O Reino
do Nepal
Figura 5 – Restaurante Kilroy`s, Kathmandu. Foto
T.Abritta, 2007.
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