Inicio o ano de 2010 diante das
Montanhas de Itatiaia, na parte alta do parque.
Silêncio total. A paisagem vazia leva-nos à introspecção. Escaladores de alturas não são vistos –
tempos chuvosos, pedras escorregadias. Nem
outras pessoas por aqui passeiam – caminhos pedregosos.
Chegando à Garganta do Registro; na
parte mais alta do caminho para Itamonte, a quase mil e oitocentos metros de
altura, entra-se no parque. O jipe,
mesmo com tração nas quatro rodas, salta, trepida e resvala no que, há muito,
foi estrada. Hoje, amontoado de pedras
soltas, entulhadas ao acaso. Caminho
quase inexistente. Apenas traços do rumo
abandonado pelo homem. A Natureza
torna-se mais presente com o verde tentando cobrir o negrume dos sucessivos
incêndios florestais e telhados abandonados nas ruínas das velhas construções.
Após alguns quilômetros continuamos a
pé. Mas a caminhada foi breve. As pernas já não são as mesmas de ontem.
Esmagado entre o azul do céu e a
aspereza das pedras, pensava: conheci os sete continentes. Florestas, desertos, geleiras, savanas e
vulcões. Rios, lagos, oceanos. Mas não chegarei mais às alturas de
Itatiaia. Ao longe fico a
contemplar. Passadas quatro décadas,
apenas aqui cheguei. Suas chaminés já
venci. Suas alturas já subi. Suas rochas já senti. O céu quase toquei. Entre suas nuvens andei.
Tão longe repousa agora o Pico das
Agulhas Negras. Tão distante a Serra das
Prateleiras com chaminés, paredões e vistas das regiões de Itatiaia e Resende
dobrando-se no horizonte distante. As
gigantescas rochas com formas singulares, como a Pedra da Tartaruga, apenas no
fundo da memória passada.
Sinto não ter caminhado por outras
alturas. Lá em cima ficaram os
Himalaias, as neves do Kilimanjaro. O
Aconcágua derretendo-se ao sol.
Até o Pico da Bandeira – ah, que
esforço pra chegar lá – deixou de ser nosso ponto culminante. Até então perdido na imensidão Amazônica, descobriu-se
o novo teto do Brasil, o Pico da Neblina, onde jamais pisarei. Pouco mais ao norte, o Monte Roraima, agora para
mim apenas a montanha que inspirou o Mundo
Perdido de Conan Doyle.
Agora estão as montanhas estendidas
como
cavalos azuis adormecidos.
No silêncio, descanso para o penoso
retorno. Um calango atrai o olhar,
mostrando caminhos a explorar. Vidas
humanas individuais são finitas. A grandeza
da Natureza é que traz sentimentos de eternidade.
Agora, o pequeno réptil caminha sobre
fungos, atravessa “florestas” de flores silvestres, sumindo no mimetismo e
riqueza dos campos de altitude com suas folhas e pétalas refletindo infinitas
cores de luz.
Muito a explorar. A descobrir.
Alegro-me. No fundo, aqui estou apenas para despedidas. Aceno ao longe, muito longe, nesta jornada
sentimental.
Tomarei outros rumos. Seguirei o calango.
No horizonte, o céu é meditativo e suave;
Parece que repousando no limite do tempo,
seus
corações se reconciliaram.
Nota:
Fragmentos intertextuais
da poesia Montanhas Ao Meio-Dia, de Charles Edward Eaton, traduzida por Jorge
de Lima.
Do livro Cidades de Memórias.
Iguana. Chichén-Itzá, México. Foto T.Abritta, 2006.
Nenhum comentário:
Postar um comentário