Publicado no Montbläat em agosto
de 2008.
Sempre
foi um sonho
do homem penetrar
no mundo invisível,
não pela
mistificação de pseudoteorias como auras, fluidos,
vibrações do éter
ou psicofotografias, mas sim pelas mãos da objetividade
da ciência. Isto
foi conseguido, em dezembro
de 1895, pelo físico
alemão W. K. Röntgen que
descobriu os Raios X, produzidos pela aceleração
de feixes de elétrons
que se chocavam com
uma placa metálica
e podiam ser registrados pela
sensibilização de um filme fotográfico. Este fato, que foi
mostrado pela radiografia
da mão de Bertha (V. Figura 1), esposa
de Röntgen, surpreendeu a Ciência, pois se tratava de uma radiação
eletromagnética que
podia atravessar a pele,
os músculos e vários
tecidos, mostrando os ossos e órgãos internos.
Podemos dizer
que esta simples
experiência, associada
aos métodos computacionais; à evolução de programas
gráficos e sofisticado ferramental
matemático foi a origem de todas as técnicas de imagens
médicas de hoje.
Figura 1 - La Main de Madame Röntgen, por Wilhelm Konrad Röntgen (1845-1923) em
22/12/1895.
Por
outro lado,
um maior
conhecimento da estrutura
da matéria nos levou à energia nuclear e,
infelizmente, a uma capacidade infinita de matar e destruir. Em agosto
lembramos o aniversário de um terrível acontecimento “fotografado” usando como “filme” a tinta queimada
de uma casa, que
registra as sombras
de uma escada e a imagem
de uma figura humana
que simplesmente
desapareceu, como se tivesse evaporado com a explosão
da bomba atômica em
Hiroshima, em 6 de agosto
de 1945 (V. Figura 2). Pode-se observar que a escada sequer foi deslocada, o que
indica que estava a uma grande distância
da explosão, mas
a vida não
foi poupada diante da intensidade da radiação. De imediato
foram mortas cento e quarenta mil pessoas, no maior
ato de terrorismo
que a Humanidade
já assistiu.
Três
dias depois
a cidade japonesa de Nagasaki também sofreu um
ataque nuclear que ceifou setenta e cinco mil
vidas neste segundo
ato de mega-terrorismo de estado, que
consiste em causar
sofrimento e morte de civis para
obter vantagens
políticas ou
militares.
Figura 2 - Hiroshima, foto Asahi, 6 de
agosto de 1945.
Aproveitando esta oportunidade
para um alerta contra o
terror nuclear,
voltamos ao nosso mundo
de imagens com
obras produzidas e vivenciadas por pessoas
civilizadas.
A “fotografia”
por Raios
X exerce um grande
apelo, devido
à sua incursão pelo
mundo invisível
e muitas vezes insólito. Alguns fotógrafos, como
por exemplo,
Helmut Newton, fizeram experimentos com
esta técnica (V. Figura
3). Mas devido
aos riscos inerentes
com a exposição
dos modelos à radiação
foram esquecidas, ficando hoje restritas ao universo
científico, técnico
ou médico.
Figura 3 - X-Ray High
Heel, foto Helmut Newton,
Vogue francesa, Paris 1994
Como uma homenagem a Röntgen, apresento
a fotografia mostrada na Figura 4, onde
uma radiografia tradicional foi
escaneada e colorizada.
Muitos
talvez não
aceitem a denominação de fotografia para esta figura. Mas qual seria
a diferença entre
a captura digital
de um escâner
e de um equipamento
chamado formalmente de câmera fotográfica?
Se insistirmos nesta discussão
estaremos voltando aos anos 60 quando alguns não consideravam como
fotografia as “derivações”
ou “recriações”
de José Oiticica Filho
Figura 4 – Les Mains de Madame X. Foto T.Abritta, 2005.